quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Shantiti - Capítulo 5 (Relbier Oliveira)



─ Meu nome é Saimon. Deveria ser escrito com “i”, mas minha mãe é latina. Não vou contar minha história, essas coisas são muito chatas.
Uma vez, eu meditava sobre minha moto através de uma estrada de terra por dentro de uma mata fechada. Só queria um lugar pra fumar e pensar mais sobre a vida. Do nada, travei as duas rodas, frenei alguns metros até parar, enfim, envolto duma nuvem rala de poeira que me alcançara. Eu devia estar em transe, mas não estava. Pensei comigo mesmo “porque diabos fiz isso?”.
─ Foi quando encontrou a caverna?
─ Porra, Heitor! Guenta ai que eu já chego lá. Acho que eu estava com sede.
─ Não era aquele rio sujo que ladeava a estrada...?
─ Eu não disse que pretendia beber a água daquele rio, só disse que achava estar com sede.
─ Por que raios você correu feito um louco pra dentro da mata?
─ Cara, me deixa contar a história?
─ Por que disse que se chamava Saimon? Com quem está falando, afinal?
─ Ah! Cara! Foda-se! Esquece essa história.
Heitor se levantou da luxuosa poltrona do centro da biblioteca, caminhou até a estante de livros e retirou um volume grosso de capa preta. Analisou-a por alguns instantes antes de abri-lo. Surpreendeu-se ao ver que todas as páginas estavam em branco.
─ Por que é que imagino que todos os outros livros também estarão em branco?
─ Heitor, Heitor, Heitor. Sua lógica é curiosa.
Heitor se dirigiu então até a ampla mesa do escritório, reparou os objetos nela disposta. Sentou-se na cadeira, balançou-se por algum instante, pensativo. Tomou na mão a caneta-pincel. Achou curiosa essa coisa tão antiga. Molhou-lhe a ponta na tinta, se certificando de que funcionaria: fez um x no próprio braço. Separou para si um papel branco que jazia sobre um montante sobre a mesa e principiou a rabisca-lo. De um sobressalto, pôs-se de pé, lançando a cadeira para trás: ─ Mas que diabos é isso! ─ exclamou, exaltado. A caneta não marcara o papel. ─ Eu não... Eu não...
─ Você está pálido, Heitor.
─ Como saio daqui?
─ Da mesma forma como entrou. Mas já quer ir embora?
Heitor se mostrava confuso. Seu andar era vago, sua mente parecia descrer em tudo.
─ Posso caminhar por ai?
─ Heitor, isso aqui não é uma prisão...
─ Mas é a sua casa!
─ Você acha que eu moro aqui? Sério mesmo que você acha que eu moro aqui? Não, Heitor, eu apenas estou aqui. Sei lá se alguém mora aqui. Eu não teria tão péssimo gosto para decoração.
Heitor deu-lhe as costas, consternado. Saiu pelo amplo portal de madeira da biblioteca. Notou estar em uma espécie de casarão, ou mansão. Um palacete. O teto era extremamente alto. Os móveis eram rústico, em sua grande maioria de madeira, mas muito bem trabalhados. Carpetes e tapetes. Amplos vitrais que permitiam a luz do dia adentrar e tornar o ambiente mui claro.
Heitor desceu as escadas de mármore branco: escada curva, que o levou ao que deveria ser a sala de estar. Aquele lugar parecia estar vazio, apenas ele e Saimon presentes.
Achou a cozinha. Caminhou em direção a pia, tinha sede. Mas a cada passo que dava em direção a ela, algo na janela parecia o deixar cada vez mais estarrecido. Ao se aproximar, parecia não crer no que via: um mar de selva. A casa estava de tal forma alta, que a vista lhe permitia ver a copa de todas as árvores. Apressou-se então em sair à pequena varanda que havia contígua à cozinha. Apoiando-se no parapeito, ficou surpreso ao ver a altura que o separava do chão. "Para onde daria a porta de saída?”, pensou consigo. Correu em direção a ela. Estaria trancada? Girou a maçaneta. Abriu.

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